Em meio ao processo de desenvolvimento das cidades, a composição das ruas e das habitações está intrinsecamente ligada ao crescimento populacional, de modo que, quando a ocupação dos espaços ocorre sem coordenação, acaba dando margem a fenômenos que caracterizam a desigualdade presente entre diferentes estratos, como a segregação socioespacial.
Além de se estabelecer como uma espécie de divisão geográfica, ela acaba se refletindo na disposição das redes de transporte e de serviços, resultando tanto em maiores dificuldades de deslocamento da população com menor acesso à renda quanto em problemas na infraestrutura de forma geral.
A partir disso, áreas de grandes dimensões ficam marginalizadas mesmo quando situadas no interior de grandes centros urbanos, prejudicando a qualidade de vida da população afetada pelo fenômeno.
Confira como quatro casos de segregação socioespacial no Brasil se apresentam com diferentes nuances.
1. Santos (SP)
Santos apresenta elementos que caracterizam, de forma geral, muito daquilo que é observado no processo de segregação socioespacial, com construções precárias em áreas de risco, sendo fruto do empobrecimento das famílias e da impossibilidade de habitação em bairros com melhores condições.
Além disso, com o crescimento promovido pelo Porto de Santos, o processo de gentrificação, reforçado pela especulação imobiliária e pelo turismo, acabou afastando do interior da cidade a população com menor acesso à renda a partir dos anos 1990.
Assim, com a constante valorização dos terrenos e da concentração de renda, o acesso às áreas mais nobres e com localização privilegiada ficou restrito. Com isso, a população que se deslocou para a região metropolitana e trabalha em Santos, prejudicada pela dinâmica, enfrenta diariamente maior tempo de deslocamento entre as cidades.
2. Manaus (AM)
Em Manaus, a ocupação da cidade, somada à geografia, tem atuado na polarização das desigualdades. Isso porque a expansão das áreas urbanas acompanhou o curso dos rios, de modo que regiões ocupadas estão situadas em altitudes mais baixas, sendo suscetíveis a alagamentos, sobretudo nos períodos de cheia.
Esse cenário de vulnerabilidade, ao mesmo tempo que afeta a infraestrutura existente, provoca o agravamento dos problemas sociais enfrentados pela população, caracterizando a segregação socioespacial.
No ranking do saneamento divulgado pelo Instituto Trata Brasil em 2022, Manaus ocupa a 12ª pior posição entre os cem maiores municípios brasileiros, com apenas 21,95% do esgoto coletado. Ainda assim, a cidade tem apresentado elevação da taxa de crescimento, passando de 1.802.014 habitantes (Censo 2010) para 2.054.731 habitantes (Prévia Censo 2022).
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3. Recife (PE)
Assim como em outras cidades, a dualidade está presente em Recife, com parte da população marginalizada excluída dos privilégios e das ocupações valorizadas, sobretudo nas áreas centrais, o que reforça o papel da distância como uma barreira no acesso a oportunidades de emprego e serviços públicos.
Esse processo, iniciado há décadas, é reflexo da apropriação de terras, fazendo que a cidade se desenvolvesse em meio à verticalização das habitações em áreas valorizadas por aqueles que detêm mais renda, acentuando a desigualdade socioeconômica. Assim como ocorrido em Santos, a dinâmica repeliu parte da população para a região metropolitana.
A parcela prejudicada da população, afetada também pela favelização, tem acesso restrito ao saneamento básico. Os efeitos ainda podem ser percebidos na educação: segundo o Censo 2010, os indicadores da região metropolitana de Recife apontam que, entre a população acima de 18 anos, 40% têm formação incompleta até o Ensino Fundamental.
4. Rio de Janeiro (RJ)
No Rio de Janeiro, o relevo contribui para tornar a segregação socioespacial ainda mais evidente, uma vez que a cidade apresenta morros espalhados em diferentes porções, sendo em muitas dessas áreas de relevo acidentado onde a população com menor acesso a renda vive exposta ao risco de deslizamentos. Ao mesmo tempo, muitas se encontram próximas das regiões mais nobres.
Além disso, merece destaque o fato de que as diferentes transformações vivenciadas acabaram gerando crise na mobilidade urbana, afetando quem está mais afastado das áreas centrais. Como responsáveis por isso é possível apontar o desequilíbrio de modais e o crescente número de automóveis destinados ao transporte individual, aumentando substancialmente o tempo de deslocamento.
Fonte: Observatório das Metrópoles, Unicamp, Revista Brasileira de Estudos Regionais e Urbanos, Câmara dos Deputados