Como a má divisão de tarefas domésticas impacta a mobilidade?

23 de abril de 2020 4 mins. de leitura

Pesquisas mostram como a sobrecarga de trabalho das mulheres afeta a mobilidade urbana em várias partes do mundo

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A mobilidade urbana de mulheres casadas com homens é prejudicada pela divisão desigual das tarefas domésticas. Com a responsabilidade da manutenção da casa, sobra menos tempo para o deslocamento delas, o que restringe o acesso a melhores oportunidades de emprego, por exemplo. Essas são conclusões de uma tese de doutorado do programa de pós-graduação em Economia da Universidade de São Paulo (USP).

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Os resultados do estudo mostram, ainda, que homens hétero e homossexuais e mulheres homossexuais têm mais chances de enfrentar deslocamentos mais longos ao trabalho em comparação com mulheres heterossexuais.

Influência do gênero nos deslocamentos

(Fonte: Shutterstock)

O gênero só influencia a duração do deslocamento ao trabalho quando o desempenho de afazeres domésticos é levado em consideração. Quando se declaram chefes de família, não há diferenças entre o tempo de viagem diária entre mulheres hétero e homossexuais.

Deborah Maria da Silva Seabra, autora da tese, utilizou dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2011 a 2015 com indivíduos casados para mensurar a divisão de tarefas domésticas. A análise considerou apenas casais entre 18 anos e 65 anos de idade inseridos no mercado de trabalho.

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A análise apontou que 14,3% das mulheres trabalham em casa, enquanto o índice entre homens é de apenas 8,4%. O tempo dedicado por elas às atividades domésticas supera em 14 horas o tempo dedicado por eles.

Com os dados do Censo realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2010, a pesquisadora analisou casais do mesmo gênero para entender como as normas sociais podem influenciar as durações de trajeto entre casa e trabalho de homens e de mulheres. Seabra concluiu que casais homossexuais registram tempo semelhante de deslocamento, o que pode demonstrar que uma flexibilização dos papéis tradicionais de gênero associados ao trabalho doméstico gera maior igualdade nos deslocamentos. Os resultados são ainda mais igualitários quando se trata de casais de mulheres.

Hipótese da Responsabilidade Doméstica e mobilidade urbana

(Fonte: Shutterstock)

A tese da economista brasileira traz a discussão do conceito de Hipótese de Responsabilidade Doméstica (HRH, em inglês) para fora do eixo dos países desenvolvidos. A HRH atribui às mulheres um tempo de deslocamento diário mais curto devido à carga desproporcional de responsabilidade doméstica em relação aos homens.

Um dos primeiros trabalhos nesse sentido foi publicado no fim da década de 1990. O estudo utilizou dados da Pesquisa Nacional de Transporte Pessoal dos Estados Unidos (NTPS) para confirmar que as mulheres se deslocavam por tempos e distâncias mais curtas do que os homens.

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Outra pesquisa avaliou dados de questionários sobre o uso de tempo na Holanda, nos anos de 2000 e 2005, para verificar o impacto da HRH. O estudo concluiu que os afazeres domésticos têm um impacto duas vezes maior no tempo de deslocamento para as mulheres do que para os homens.

Na Itália, o banco de dados do Instituto Nacional de Estatística passou a considerar as diferenças de gênero na mobilidade pessoal. A análise dos registros aponta que as dissemelhanças no tempo de deslocamento estão relacionadas à estrutura socioeconômica e ao contexto geográfico de diferentes mercados de trabalho regionais.

Impacto maior em mulheres com filhos

Em Tóquio (Japão), uma pesquisa examinou a participação das mulheres no mercado de trabalho e os padrões de mobilidade urbana. O estado civil e a presença de filhos impactam fortemente os deslocamentos delas.

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Os resultados indicam que, para as mães casadas, um tempo de viagem mais longo está associado à menor participação no mercado de trabalho, enquanto para as solteiras e sem filhos essas associações não são em sua maioria tão significativas.

Entre as mães casadas, o impacto é maior para quem tem ensino superior do que para quem tem ensino médio ou menos, sugerindo que as mães com alta escolaridade são especialmente sensíveis ao tempo de deslocamento. A restrição na possibilidade de se deslocar, por sua vez, intensifica a divisão desigual do trabalho doméstico, resultando em padrões únicos para as mães casadas.

Fonte: USP, SpringerLink, Iza, ResearchGate, ScienceDirect

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