Fim de restrições legais não é suficiente para conter a discriminação
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Até pouco tempo, ainda havia mulheres proibidas — por lei — de dirigir. O exemplo mais recente é a Arábia Saudita, que só em junho de 2018 liberou a habilitação feminina; antes, mulheres só podiam andar em veículos com motoristas contratados e mediante a autorização de seus tutores familiares (pais, irmãos ou maridos). Segundo relatório publicado no jornal Saudi Gazette, hoje 70 mil sauditas já têm licença para dirigir.
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No documentário Autoescola para Mulheres Sauditas, produzido pela HBO, vê-se o retrato das mudanças após a transformação legal. O filme se passa em uma escola de condutores exclusiva para mulheres, na qual foram feitas entrevistas individuais e familiares para discutir os direitos delas no trânsito e na vida.
Uma das participantes, Shahad al-Humaizi, a primeira saudita a entrar na plataforma Uber como motorista, conta que muitos passageiros se assustam com sua independência, mas ela aproveita para debater o assunto durante o trajeto.
Em uma das cenas, Shahad conversa com um passageiro e pergunta se ele apoia as reformas. Ele responde que sim, mas apenas até certo ponto, por ter medo de que a natureza emocional das mulheres traga problemas futuros.
Nota-se, então, que as mudanças legais ainda não são suficientes para romper a barreira do preconceito. Ainda hoje, é comum ouvir a velha piada de que “mulher no volante é perigo constante”, e esse tipo de visão segue como um grande entrave à proposta de um trânsito justo e diverso e uma economia global mais poderosa.
Os comportamentos e as ideias discriminatórias ainda estão bastante enraizados na cultura, o que pode causar até impactos psicológicos nas mulheres. Uma pesquisa realizada pela Associação Brasileira de Medicina de Trânsito (Abramet) mostra que dois milhões de brasileiros têm medo de dirigir, sendo que 80% são mulheres.
Muitas relatam que, mesmo após tirarem a carteira de habilitação, carregam um medo persistente e acabam desistindo de assumir o volante. Esse é um fato que impede a plena inclusão delas nesse ambiente, limitando sua liberdade de mobilidade e dificultando sua inserção no mercado de trabalho — portanto, o panorama também impacta a economia.
Nas últimas décadas, a maior inserção das mulheres no mercado profissional possibilitou que elas ocupassem cada vez mais espaços que antes eram majoritariamente masculinos.
Ao volante, elas têm sido capazes de superar os homens no quesito habilidade. Dados do Departamento Estadual de Trânsito (Detran) apontam que elas cometem menos infrações; de acordo com o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), as motoristas respondem hoje por mais de 22% das habilitações no Brasil. De 2012 até 2017, o número de mulheres com carteira de habilitação categoria A subiu de 4.512.755 para 6.771.933.
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Fontes: The Guardian, HBO, The New York Times.