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Como a licença para pedalar pode estimular o racismo estrutural?

Washington, DC, USA - August 22, 2020. A member of Continue to Serve, military veterans who support Black Lives Matter, rides ahead of the Defund the Police March with a sign on his bike

As leis de registro e licenciamento de bicicletas, uma espécie de “licença para pedalar”, perduram nos códigos municipais de várias cidades dos Estados Unidos (EUA). A maioria das regras sobre o ciclismo é pouco conhecida e raramente aplicada, mas quando é, pode ser influenciada por preconceitos raciais, segundo especialistas em justiça e transportes no país.

Os negros e latinos que andam de bike têm maior chance de serem parados, revistados, multados e presos pela polícia, conforme mostram dados públicos sobre abordagens policiais de ciclistas em Oakland, Nova Orleans e Washington. A pesquisa, realizada pela revista Bicycling em 2020, também confirma que os bairros negros tendem a ser mais fiscalizados do que as áreas brancas.

Outro relatório, apresentado pelo jornal Miami New Times, aponta que 86% das 460 abordagens policiais sobre bicicletas feitas na cidade de Fort Lauderdale, Flórida, entre julho de 2010 e junho de 2013, tinham como alvo regiões com uma maioria de afro-americanos, enquanto quase nenhuma incursão foi realizada em bairros predominantemente brancos.

Como funciona a licença para pedalar?

Infrações de ciclistas, como falta de registro ou uso de capacete, podem gerar multas e até prisão em algumas cidades dos EUA. (Fonte: Shutterstock/John Dvorak/Reprodução)

As leis de registro e licenciamento de bicicletas atuam de forma muito semelhante às de registro de veículos motorizados, orientando os proprietários de bicicletas a registrar seus passeios na cidade e obter uma licença para pedalar, geralmente por uma pequena taxa.

Perth Amboy, em Nova Jersey, é uma das cidades americanas que têm legislação desse tipo. A licença custa apenas US$ 0,50 por ano, mas as violações podem gerar uma multa de até US$ 50, retenção da bike e ainda uma pena de prisão de até 10 dias. As bicicletas apreendidas podem ser devolvidas após o pagamento das multas.

Os legisladores que defendem essas regras dizem que elas são uma forma útil de rastrear bicicletas perdidas ou roubadas. Algumas cidades implementaram a medida como uma tentativa de aumentar a receita, melhorar a segurança ou garantir que os ciclistas tenham alguma participação no pagamento da infraestrutura que compartilham com os carros.

Por que a lei pode ser discriminatória?

Infrações pequenas são utilizadas como desculpa para abordagem de pessoas negras que, inclusive, pode resultar em morte. (Fonte: Shutterstock/VDB Photos/Reprodução)

Os policiais podem usar a fiscalização das regras de trânsito para praticar atos de racismo, sob o pretexto de investigar, de forma discriminatória, crimes como posse de drogas ou armas.

Em uma pesquisa realizada pela empresa de planejamento urbano Equitable Cities com mais de 2 mil pessoas em diversas comunidades em Nova Jersey, quase 14% de todos os entrevistados afirmaram que foram injustamente parados por um policial enquanto estavam de bicicleta, mas esse percentual é de 23% entre os ciclistas negros e 28% entre os latinos.

Abordagens a ciclistas negros por conta de infrações menores já resultaram em morte. Em agosto do ano passado, Dijon Kizzee, um ciclista negro de 29 anos, foi baleado mais de 20 vezes nas costas pela polícia em Los Angeles depois de ser abordado por andar na contramão da via.

Ineficácia das regras sobre bike

As leis de licenciamento de bicicletas há muito tempo são uma fonte de controvérsia e descontentamento nos círculos de defesa das bicicletas. A organização New Jersey Bike and Walk Coalition defende que essas regras devam ser abolidas por conta do alto custo de administração e a dificuldade de aplicar a legislação de forma igualitária.

Uma alternativa para as cidades é o registro gratuito de bicicletas administrado pela organização sem fins lucrativos Bike Index. A ferramenta permite que policiais e pessoas de cidades em todo os Estados Unidos pesquisem bicicletas desaparecidas no banco de dados.

Fonte: Bloomberg, New Jersey Advanced Media, Bicycling, Departamento de Transporte dos Estados Unidos, Asheville on bikes.

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