Como recuperar regiões urbanas que ficaram desertas na pandemia?

8 de agosto de 2022 6 mins. de leitura

Especialistas apontam que as cidades precisam ser mais plurais e voltadas a quem vive nos territórios

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Para alegria de alguns, e tristeza de outros, o home office veio para ficar. Com ele, surgiram alguns novos desertos urbanos, expressão que se refere a regiões antes cheias de movimento, mas agora vazias. Sem escritórios, há também menos restaurantes, bancos, comércios, serviços e tudo mais que compõe uma cidade viva.

Por isso, especialistas e gestores públicos têm-se perguntado: afinal, como devolver vida às cidades? Como tornar os espaços vazios em lugares mais habitados e devolver o caráter diversificado, inclusivo e mobilizador?

A equipe do Estadão Summit Mobilidade conversou com pesquisadores da área para conhecer algumas iniciativas que podem ser úteis para acabar com esses desertos nas cidades. Confira!

1. Diversificar os usos do solo urbano

Conciliar escritórios, comércios e residências em um mesmo território ajuda a dinamizar o uso e a evitar o esvaziamento de regiões urbanas
Conciliar escritórios, comércios e residências em um mesmo território ajuda a dinamizar o uso e a evitar o esvaziamento de regiões urbanas. (Fonte: Shutterstock/Reprodução)

Um ponto importante para manter a cidade viva é destinar diferentes usos ao solo urbano. Segundo Rivail Vanin de Andrade, doutor em Arquitetura e Urbanismo e professor da Universidade Positivo (UP), o espaço urbano ganha com zonas que estimulem a circulação de diferentes perfis de pessoas.

Desde que o home office se tornou uma tendência, no início de 2020, algumas regiões se esvaziaram. Dessa forma, é possível perceber essa questão mesmo em locais que não estão esvaziadas, mas cuja ocupação é muito singular, como bairros industriais ou comerciais que ficam “mortos” à noite. Então, vale a máxima: quanto menos diversos são os usos, menor é a diversidade de pessoas e mais reduzidos os horários de vivência.

“É interessante estimular zonas residenciais mistas, com a presença de famílias de diferentes estratos de consumo, de comércio e de serviço vicinal diversificado, equipamentos comunitários qualificados para atender diferentes perfis etários e áreas de lazer”, diz Andrade.

O poder público tem um papel fundamental nisso, mas outra boa estratégia é incentivar espaços de fruição, como ambientes particulares que permitam o acesso público.

Segundo Andrade: “Em geral, esses espaços apresentam uma maior qualidade de projeto, execução e manutenção, tornando-os mais atrativos e acrescentando áreas qualificadas à permanência da população”.

O desafio é enorme. O professor comenta que os grandes condomínios residenciais apresentam pouca ou nenhuma diversidade de uso, obrigando as pessoas a circularem de carro e, com isso, pequenas compras que ocorriam com frequência a pé, próximo de casa, dão lugar a compras maiores e mais esporádicas em hipermercados ou shopping centers. Ao se fragilizar o mercado local, é mais um passo que a cidade dá rumo ao esvaziamento.

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2. Ouvir quem vive no território

As melhores pessoas para dizer o que um certo espaço público precisa ter são aquelas que vivem no local. Por isso, Paulo Nascimento Neto defende que, para fugir dos desertos urbanos, é fundamental envolver as pessoas em um processo democrático e transparente.

O arquiteto, urbanista e professor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) lembra que a reocupação dos vazios das cidades envolve evitar que as pessoas sejam pressionadas a sair dos seus locais tradicionais. Portanto, o desafio, segundo o especialista, é retomar o interesse do mercado na área ao mesmo tempo que se evita sua gentrificação.

A partir das demandas de quem vive no local, pode-se articular estratégias que contemplem diferentes eixos da vida da população local. Um exemplo são soluções habitacionais para a população de menor renda, sobretudo diante do crescimento das desigualdades sociais.

3. Desenhar uma cidade mais humanizada

Comércios com fachadas ativas são um bom modo de privilegiar a interação entre os espaços público e privado
Comércios com fachadas ativas são um bom modo de privilegiar a interação entre os espaços público e privado (Fonte: Shutterstock/Reprodução)

Embora os principais problemas das cidades sejam conhecidos, o layout urbano responde de modo muito tímido a eles. As cidades continuam sendo desenhadas como sempre foram, ou seja, com pouca centralidade para a vida comum das pessoas. Quer ver um exemplo? Por que os bairros residenciais não priorizam calçadas e ciclovias em vez de faixas destinadas a carros?

Andrade sugere que, em um bairro periférico, um carro provavelmente terá facilidade em dar uma volta na quadra; já para um cadeirante ou alguém com um carrinho de bebê, por exemplo, isso pode ser um suplício. É por isso que é preciso pensar em cidades voltadas para pessoas.

Além das vias urbanas, Andrade comenta as fachadas ativas, que têm permeabilidade visual. Dentro e fora, podem ser conceitos mais difusos, a depender do desenho dos espaços urbanos.

“Quando temos mesas de um restaurante na calçada, mais pessoas permanecem no espaço público graças ao que se chama os ‘olhos da rua’, que geram uma percepção de maior segurança”, ele exemplifica.

Outra opção interessante é não usar muros fechados na fachada de lojas e condomínios, que dão a impressão de “paredes cegas”, por não verem a rua. Em vez disso, pode-se usar vidro.

O pesquisador lembra que uma fachada transparente em uma academia, com pessoas fazendo atividade física viradas para rua, gera uma percepção maior de segurança para o pedestre.

Em suma, é preciso tornar o ambiente urbano um espaço agradável de se permanecer. “Faixas de passeio largas, aumento das condições de acessibilidade, proteção em relação aos veículos motorizados, iluminação eficiente, estratégias microclimáticas, proteção contra chuva e sol intenso, mobiliário urbano multifuncional, locais para atividades físicas e espaços de permanência qualificados permitindo conversa entre grupos são boas iniciativas”, conclui Andrade.

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Fonte: Rivail Vanin de Andrade, doutor em Arquitetura e Urbanismo e professor da Universidade Positivo (UP); Paulo Nascimento Neto, arquiteto e urbanista e professor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR).

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